6.8.11

(without) destiny

Por mais que a dor me persiga, essa já deixou de ser capaz de alimentar e mover as esperanças. Instalou-se uma rotina terrível neste nosso amor constante e duradouro, que quebrou todos os instantes espontâneos, íntimos e envolventes, deixando apenas os burburinhos de dois corações despedaçados, deambulando e enchendo as margens de um rio, sem um destino, sem eira nem beira. Esses burburinhos, desses corações que arranjaram novas moradas noutros corpos quaisquer, devem estar agora alojados em cantinhos resplandescentes. Os nossos corações já não se (re)conhecem e o brilho da eterna paixão esvaiu-se.
Eu já não me recordo do teu olhar que outrora te distinguia, nem dos teus passos largos e pesados que te faziam dar imensamente nas vistas... nem do toque dos teus lábios encostados nos meus, nem do sabor desses mesmos beijos, nem das linhas da tua face, nem da textura dos teus dedos que limpavam a minha face, por muitas vezes lavada em lágrimas, nem dos vértices dos teus membros, nem do aumento de temperatura que os teus abraços me causavam, nem de um resto de nada. Temo que isto seja a nossa ruptura, a derradeira ruptura, e que nem intrínsecos talentos nos salvem deste buraco sem fundo para que a distância nos atira, sem pudores.
Os verbos, os nomes mais amorosos e até mesmo as mais pequenas palavras estão saturadas. As melodias perderam o som e os desabafos o espírito, os retratos a imagem e os corpos as poses. Já nem o tempo lê as mágicas poesias ou cartas que te escrevo, e o vento força a tua ida e os meus cabelos, voando, cobrem-me o rosto desolado, o diabo deixa-me um isqueiro e ajo da única maneira que ainda conheço: queimo as tuas lembranças (que não me trazem nem réstias de pequenos nadas), enterro as cinzas numa vala distante (como tu me tens soado, sempre distante), sem esperar um último gesto teu ou suspiro meloso. Este é o fim subterrado, que está já mais do que acabado.


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